A interseccionalidade e sua importância para a inclusão dos 50+

Walter Alves • 26 de outubro de 2022

Interseccionalidade, o que é isso?


Numa leitura, assistindo uma palestra, um debate ou ouvindo um podcast nos deparamos com algumas palavras de difícil compreensão no seu significado e até na sua grafia.


A palavra do título é uma delas; com 19 letras – interseccionalidade – foge do comum no português do Brasil e também de nossas leituras cotidianas.


A história conta que ela foi utilizada, conceitualmente, pela primeira vez no artigo Demarginalizing the Intersection of Race and Sex: A Black Feminist Critique of Antidiscrimination Doctrine, Feminist Theory and Antiracist Politics – (Desmarginalizando a intersecção de raça e sexo: uma crítica feminista negra da doutrina antidiscriminação, teoria feminista e política antirracista, em tradução livre), publicado em 1989, de autoria de Kimberlé Crenshaw. Clique AQUI para acessar.


A então professora de Direito na Escola de Direito de Los Angeles da Universidade da Califórnia informa já no primeiro parágrafo que “Escolhi este título, como ponto de partida em meus esforços, para desenvolver uma crítica feminista negra ao que se apresenta à tendência de tratar raça e gênero como categorias mutuamente exclusivas de experiência e análise”.


Até então, raça e gênero, em caixinhas hermeticamente fechadas, não se misturavam. Não podiam ser analisadas conjuntamente. Não cabiam na mesma frase.


Na página seguinte do artigo, ela anuncia que pretende discutir como esta estrutura contribui para marginalizar as mulheres negras tanto nas lutas feministas quanto nas antirracistas.


Daí a necessidade de lançar mão de uma nova categoria de análise. “Como a experiência interseccional é maior do que a soma do racismo e sexismo, qualquer análise que não leve a interseccionalidade em conta não pode abordar suficientemente a maneira particular pela qual as mulheres negras são subordinadas”, afirma Kimberlé Crenshaw.

bandeira representando a interseccionalidade: bandeira lgbt ao fundo com símbolos de lutas como racismo, sexismo,  etc

Chega de teoria e história…


O conceito teve sua gênese na conjugação de raça e gênero, mas quaisquer outros marcadores identitários – idade, classe socioeconômica, orientação sexual, condição física ou sensorial, origem, local de moradia, estado civil, time de futebol do coração, etc. – combinados são exemplos de interseccionalidade.


O método de análise além de demonstrar que somos múltiplos e diversos, nos permite observar que temos vivências limitadas pela ausência de igualdade de oportunidades e pela iniquidade, mas, também, temos vivências de poder e mando que são potencializadas dependendo das combinações desses marcadores.


Por exemplo, não é opinião afirmar que os poderes políticos e econômicos são exercidos por homens, brancos e heterossexuais, isto é fato.


Do mesmo modo que é fato afirmar que a taxa de homicídio entre os não negros é de 13,9 casos a cada 100 mil habitantes e entre os negros chegou a 37,8 dentro dos mesmos 100 mil; sabendo que os negros assassinados são em sua quase totalidade jovens – entre 18 e 24 anos – e moradores das periferias nos grandes centros urbanos, segundo o Atlas da Violência 2017, produzido pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) em parceria com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP).


Outro exemplo de aplicação da metodologia considerando local de moradia, classe socioeconômica e expectativa de vida está no artigo Envelhecimento para iniciantes, escrito por mim e publicado em setembro de 2020 no Blog Maturi.


Mesmo sem citar o termo interseccionalidade mostro a diferença do que é viver e morrer em 4 bairros da cidade de São Paulo, 2 da periferia (Cidade Tiradentes e Grajaú) e 2 da região mais rica (Jardim Paulista e Moema).


Segundo o Mapa da Desigualdade 2019 da Rede Nossa São Paulo, nos 2 bairros mais ricos até meados de junho de 2020 haviam morrido 130 pessoas por Covid-19. Nos bairros periféricos os dados diferem muito, até a mesma data anterior haviam morrido 460 pessoas pela mesma doença.


Não há, portanto, que se falar em envelhecimento, é preciso utilizar a palavra no plural – envelhecimentos. A justificativa está no exemplo acima: em bairros periféricos como Cidade Tiradentes e Grajaú a expectativa de vida é de 58 anos, no Jardim Paulista e em Moema é de 80 anos.


Não é nada estranho que na periferia, até junho de 2020, se morria de Covid-19 3,5 vezes mais que nos bairros mais ricos.


Live MaturiTalks


Na quarta-feira, 17 de março, uma Live sobre interseccionalidade foi patrocinada pela Maturi. Andrea Bisker mediou o encontro comentando as respostas e transmitindo as perguntas dos telespectadores e telespectadoras. Participaram Benjamin Rosenthal professor da FGV São Paulo, Cláudia Arruga juíza de Direito Previdenciário, Dilma Campos CEO da Outra Praia, Fabio Mariano professor da ESPM e eu, Walter Alves, especialista em diversidade & inclusão.


Assista a Live do MaturiTalks na íntegra:

Aqui, destaco dois momentos que foram além da discussão sobre interseccionalidade. Andrea Bisker pergunta ao professor Benjamin Rosenthal qual a importância em promover a diversidade e inclusão nas empresas?


Segundo Benjamin Rosenthal, “A importância é pela valorização das pessoas mais velhas. O maior dano que o preconceito etário provoca é o da exclusão, pela sociedade, da pessoa que envelhece, do trabalho, da convivência com diversos grupos e de seu papel social. Além de a colocar dentro de caixinhas que ela não cabe porque ainda tem energia para trabalhar, para conviver com grupos e para desempenhar seu papel social”.


Numa outra abordagem Andrea Bisker perguntou “Como fazer a inclusão nas organizações?” e o professor Fabio Mariano respondeu:


“Não há futuro sem inclusão. No entanto, temos que tomar cuidado para que a inclusão da diversidade não seja feita somente pelo ponto de vista econômico financeiro. Se não fizermos uma inclusão social onde as pessoas se identifiquem como pessoas pretas ou não tiverem o orgulho de dizer ‘eu sou gay’; não haverá inclusão alguma”.


A importância da interseccionalidade não está na novidade para uma grande maioria e nem na demonstração de conhecimentos metodológicos por alguns poucos. A importância está na possibilidade de compreender como uma característica como o envelhecimento opera como catalisador nas intersecções com quaisquer outros marcadores.


Para que haja efetividade e mesmo verdade de propósito na inclusão, é preciso considerar o envelhecimento como um pilar fundante nas políticas públicas ou mesmo num programa organizacional.


Gostou do artigo? Comente abaixo. Abraços Maduros!

Compartilhe esse conteúdo

Artigos recentes

Como o Grupo Boticário e a Maturi criaram um projeto para posicionar a marca como um dos maiores ali
11 de dezembro de 2025
Como o Grupo Boticário e a Maturi criaram um projeto para posicionar a marca como um dos maiores aliados das mulheres maduras do Brasil
11 de novembro de 2025
O etarismo no ambiente de trabalho pode ser sutil — e, justamente por isso, perigoso. Muitas vezes, ele está embutido em processos, linguagens e práticas que parecem neutras, mas que na prática excluem profissionais mais velhos. O prejuízo não se limita a quem é deixado de fora, mas às empresas, que perdem talento, diversidade e performance. Segundo o relatório Future of Work 2023 , da AARP (American Association of Retired Persons), 2 a cada 3 profissionais 50+ já sentiram discriminação por idade no trabalho. No Brasil, a Pesquisa Maturi (2023 - acesse aqui ) mostra que 9 em cada 10 profissionais maduros estão em busca de recolocação. “Enquanto o tema for abordado como um posicionamento de marca, dificilmente haverá uma transformação genuína na sociedade. Porém, nós entendemos que esse esforço não pode caminhar sozinho pelo setor privado, é necessário que o governo e a sociedade estejam na mesma direção”, comenta Mórris Litvak, CEO e fundador da Maturi. Está na hora de rever práticas e criar ambientes mais inclusivos para todas as idades. A seguir, um checklist para você identificar se o etarismo ainda está presente na sua organização: Checklist: sua empresa está pronta para incluir talentos 50+? 1. Recrutamento e seleção: - Você analisa se profissionais 50+ estão chegando às suas shortlists? - As descrições de vaga evitam termos como “jovem talento”, “recém-formado” ou “perfil júnior”? - O RH considera profissionais maduros para cargos operacionais e estratégicos? 2. Cultura organizacional: - O tema da diversidade etária está incluído nas ações de DEI? - A comunicação interna retrata pessoas de diferentes idades em cargos de liderança? - Existem canais para denunciar qualquer tipo de discriminação? 3. Desenvolvimento e carreira: - Pessoas 50+ têm acesso a programas de formação, capacitação e mentoring? - A empresa promove ações para combater estereótipos sobre envelhecimento? - Há incentivo à troca intergeracional e à valorização da experiência? 4. Gestão de talentos e sucessão: - Profissionais maduros são considerados em planos de sucessão? - Existe um olhar estratégico para manter 50+ na ativa, inclusive com formatos híbridos ou carga horária flexível? 5. Preparação para aposentadoria: - Sua empresa tem programas voltados à transição e à preparação para aposentadoria? - Há políticas para que esse momento não represente exclusão, mas sim reorientação? Passando a limpo Se sua empresa respondeu “não” ou “não sei” para um ou mais itens, já é sinal de alerta. O etarismo estrutural pode estar presente e impactando diretamente a diversidade, a inovação e os resultados da sua equipe. O combate ao etarismo não começa só com treinamentos, mas com uma mudança de mentalidade nos processos mais básicos do RH. Trata-se de enxergar a idade como um ativo estratégico e não como um impeditivo. Já conhece a certificação Age Friendly? O selo Age Friendly Employer reconhece as empresas promotoras da diversidade etária. Atualmente são 19 empresas certificadas no Brasil, organizações que estão na vanguarda das melhores práticas para um ambiente inclusivo para pessoas 50+. Se a sua empresa quer entender como iniciar essa jornada e obter a Certificação Age-Friendly, preencha o formulário para agendar uma reunião com a nossa equipe.
4 de novembro de 2025
O último MeetupMaturi de 2025 reuniu duas empresas que vêm se destacando na pauta da diversidade etária: Sanofi e Volkswagen . Representadas por Alexandre Porto, Co-líder do grupo Gerações Conectadas da Volkswagen, e Elcio Monteiro, do Pilar de Gerações+ da Sanofi, as organizações compartilharam suas jornadas no processo de Certificação Age-Friendly Employer, mostrando, na prática, o que significa transformar a cultura organizacional em direção a um ambiente realmente multigeracional. O encontro revelou aprendizados valiosos sobre como as empresas podem evoluir em seus roadmaps age-friendly — da conscientização à implementação de ações concretas. A seguir, reunimos cinco grandes insights dessa conversa inspiradora. 1. A jornada começa conhecendo a realidade geracional da organização Antes de qualquer estratégia, é essencial conhecer a própria realidade geracional. A Volkswagen percebeu que o primeiro passo para se certificar era entender quem são seus colaboradores 50+, onde estão as oportunidades e quais áreas precisavam se envolver mais com o tema. "O primeiro passo é saber onde estamos e com quem estamos. A diversidade etária começa olhando para dentro" 2. Ser uma empresa age-friendly é assumir um compromisso público A Certificação Age-Friendly Employer não é apenas um selo — é um compromisso público de avanço contínuo. Como destacou a Volkswagen, o mais importante é demonstrar, de forma transparente, como a empresa reconhece e valoriza o protagonismo das diferentes gerações. "Mais do que conquistar a certificação, é mantê-la viva no cotidiano da empresa” 3. O que importa é evoluir: a recertificação mede progresso, não perfeição A Sanofi, primeira empresa certificada e recertificada no Brasil, destacou que o processo é uma oportunidade para comparar a empresa com ela mesma. A cada recertificação, é possível medir avanços, consolidar práticas e aprimorar o que ainda precisa evoluir. “A recertificação é sobre amadurecimento — ela reconhece quem continua aprendendo.”, Elcio Monteiro 4. Trocas entre empresas aceleram aprendizados Um dos diferenciais do ecossistema Age-Friendly é o espaço de trocas entre empresas certificadas. Durante os fóruns e encontros promovidos pela Maturi, companhias como Sanofi e Volkswagen compartilham experiências, desafios e soluções. Essa colaboração tem gerado novos programas, ideias e conexões que fortalecem toda a rede. “Quando as empresas trocam, todo o ecossistema evolui” 5. Diversidade etária é parte da estratégia, não um projeto paralelo Tornar-se uma empresa Age-Friendly não é sobre um programa pontual, mas sobre incorporar a longevidade como valor estratégico. Como reforçou a Sanofi, uma empresa verdadeiramente diversa é aquela que reflete a sociedade onde está inserida — em idade, gênero, raça e experiências. “A diversidade precisa estar integrada à estratégia, não isolada em um pilar” O encontro com Sanofi e Volkswagen mostrou que o caminho para a maturidade corporativa é feito de aprendizado, comprometimento e cooperação. Cada empresa está em uma etapa diferente do seu roadmap Age-Friendly, mas todas compartilham o mesmo propósito: criar organizações mais humanas, inclusivas e preparadas para o futuro do trabalho. 💡 Quer saber mais sobre a Certificação Age-Friendly e como aplicar esse roadmap na sua empresa? 👉 Acesse agefriendly.com.br