Cultura organizacional e preconceito etário

Walter Alves • 17 de outubro de 2020

Combater a discriminação contra os mais velhos na cultura organizacional é um dos grandes desafios atuais para as empresas. Entenda por que nesse artigo: 


Uma das ideias que mais influenciou o mundo no século passado, e o ocidente em particular, foi transmitida através de um artigo de Milton Friedman (1912-2006). Publicado há 50 anos, no The New York Times, a doutrina Friedman, essencialmente dizia: “a responsabilidade social das empresas é aumentar seus lucros”. Era a reafirmação do que ele havia escrito no livro Capitalismo e Liberdade, de 1962.


Considerado o economista mais influente da segunda metade do século, Friedman – líder, do hoje, Departamento de Economia da Universidade de Chicago – influenciou gerações de economistas, governos em todos os continentes, executivos e empresas espalhadas mundo.


Dani Rodrik em recente artigo no Project Syndicate sintetizou: “A doutrina Friedman marcou nossa era, legitimou o capitalismo desenfreado que produziu insegurança econômica, alimentou a crescente desigualdade, aprofundou as divisões regionais e intensificou a mudança climática e outros problemas ambientais.”


A doutrina Friedman, portanto, deixou sua marca, que não pode ser esquecida e nem apagada, ao proclamar que qualquer preocupação nas organização, inclusive com as pessoas, deveria vir depois da obtenção do lucro. É evidente que esta marca profunda teve forte ascendência nas organizações e, consequentemente, em sua cultura.

homem maduro sorri em frente ao computador

– Mas o que é mesmo cultura organizacional?


Edgar H. Schein, um dos autores mais citados na literatura especializada, conceitua cultura como “um padrão de pressuposições básicas compartilhadas, que foi aprendido por um grupo à medida que solucionava seus problemas de adaptação externa e de integração interna.


Esse padrão tem funcionado bem o suficiente para ser considerado válido e, por conseguinte, para ser ensinado aos novos membros como o modo correto de perceber, pensar e sentir-se em relação esses problemas” Cultura Organizacional e Liderança (2017).


Dito de outro modo, cultura organizacional é entendida como o conjunto de crenças e valores que apoia as práticas cotidianas e eventuais, formais e informais em cada organização. É algo intangível, no entanto, influencia, permanentemente, os acontecimentos organizacionais.


Como é um dos assuntos mais debatidos na área de administração e negócios há inúmeros conceitos com pequenas variações e várias especificidades.


O que, de fato, nos importa neste artigo é que são valores e princípios compartilhados entre líderes e liderados que irão, com o tempo, firmar uma base de práticas, atitudes e comportamentos que, no seu conjunto, darão firmeza e sustentação aos traços de uma cultura singular, capaz de atrair, reter e dispensar trabalhadores segundo conceitos, preconceitos e vieses inconscientes desenvolvidos e fomentados na organização.


Pois quando as organizações assumem culturalmente que “a responsabilidade social das empresas é aumentar seus lucros” ela fará de tudo para que isto aconteça, inclusive, submetendo sua política de relacionamento com as pessoas, seus trabalhadores, a esta ótica.


As consequências?


São inúmeras e demasiadamente conhecidas: desvalorização das pessoas em geral e dos trabalhadores em particular; superexploração do trabalho; acreditar que as pessoas sejam, somente, recursos; enxergar os funcionários como engrenagens de uma grande máquina; atuar de modo que que quando uma dessas engrenagens se desgasta ou quebra basta substituí-la para que a máquina volte a funcionar com a mesma eficácia e eficiência.


Ou seja, as engrenagens/pessoas devem ser substituídas tão logo se desgastem naturalmente/envelheçam ou quebrem/percam a função.


Afirmar que este pensamento e prática são a base do preconceito etário na sociedade seria desconhecer a história da humanidade, mas não seria nenhum exagero sustentar que, sim, este pensamento e prática contribui para que as empresas comprovassem sua aversão ao envelhecimento dos trabalhadores e, consequentemente, fortalecessem o preconceito etário tanto dentro das organizações quanto na sociedade ao sucatear engrenagens que não mais serviam para seus propósitos.


A longevidade e o, consequente, envelhecimento populacional é, atualmente, um tema primordial no mundo do trabalho. No Brasil, o assunto toma ares de urgência pelo aumento acelerado – em quantidade e proporcionalidade – dos 50+.


O País, formado pelo Estado, Governos, sociedade civil, empresas e sindicatos patronais e de trabalhadores não podem mais se dar ao luxo de fecharem os olhos para o preconceito etário contra os mais velhos. Há a premente necessidade que o País pense, debata e crie ações e estratégias que contribuam para mitigar a incerteza e a percepção de insegurança provocada pelo envelhecimento dentro e fora das organizações.

Argumentos não faltam.


Não se discute mais a vantagem que os 50+ têm sobre os mais novos quanto às habilidades sociais, como confiabilidade, flexibilidade e lealdade; criatividade; vontade de aprender e habilidades gerenciais.


É certo que os mais jovens têm as habilidades técnicas mais atualizadas e esta vantagem deve ser explorada, no limite, na formação de equipes transgeracionais onde as maiores preocupações devam ser: a diversidade de olhares para um mesmo contexto; a convivência respeitosa de pessoas com características, condições e opiniões diferentes; a construção de conhecimento em busca da maior eficiência e eficácia; além de uma nova cultura organizacional que combata o preconceito etário e elimine a discriminação contra os mais velhos.


Assista um dos episódios do programa Trabalho do Futuro, que eu apresento e está disponível no canal do Youtube da Maturi, abordando os dramas e situações que envolvem a questão do preconceito etário:


Compartilhe esse conteúdo

Artigos recentes

Por Contato Maturi 4 de novembro de 2025
O último MeetupMaturi de 2025 reuniu duas empresas que vêm se destacando na pauta da diversidade etária: Sanofi e Volkswagen . Representadas por Alexandre Porto, Co-líder do grupo Gerações Conectadas da Volkswagen, e Elcio Monteiro, do Pilar de Gerações+ da Sanofi, as organizações compartilharam suas jornadas no processo de Certificação Age-Friendly Employer, mostrando, na prática, o que significa transformar a cultura organizacional em direção a um ambiente realmente multigeracional. O encontro revelou aprendizados valiosos sobre como as empresas podem evoluir em seus roadmaps age-friendly — da conscientização à implementação de ações concretas. A seguir, reunimos cinco grandes insights dessa conversa inspiradora. 1. A jornada começa conhecendo a realidade geracional da organização Antes de qualquer estratégia, é essencial conhecer a própria realidade geracional. A Volkswagen percebeu que o primeiro passo para se certificar era entender quem são seus colaboradores 50+, onde estão as oportunidades e quais áreas precisavam se envolver mais com o tema. "O primeiro passo é saber onde estamos e com quem estamos. A diversidade etária começa olhando para dentro" 2. Ser uma empresa age-friendly é assumir um compromisso público A Certificação Age-Friendly Employer não é apenas um selo — é um compromisso público de avanço contínuo. Como destacou a Volkswagen, o mais importante é demonstrar, de forma transparente, como a empresa reconhece e valoriza o protagonismo das diferentes gerações. "Mais do que conquistar a certificação, é mantê-la viva no cotidiano da empresa” 3. O que importa é evoluir: a recertificação mede progresso, não perfeição A Sanofi, primeira empresa certificada e recertificada no Brasil, destacou que o processo é uma oportunidade para comparar a empresa com ela mesma. A cada recertificação, é possível medir avanços, consolidar práticas e aprimorar o que ainda precisa evoluir. “A recertificação é sobre amadurecimento — ela reconhece quem continua aprendendo.”, Elcio Monteiro 4. Trocas entre empresas aceleram aprendizados Um dos diferenciais do ecossistema Age-Friendly é o espaço de trocas entre empresas certificadas. Durante os fóruns e encontros promovidos pela Maturi, companhias como Sanofi e Volkswagen compartilham experiências, desafios e soluções. Essa colaboração tem gerado novos programas, ideias e conexões que fortalecem toda a rede. “Quando as empresas trocam, todo o ecossistema evolui” 5. Diversidade etária é parte da estratégia, não um projeto paralelo Tornar-se uma empresa Age-Friendly não é sobre um programa pontual, mas sobre incorporar a longevidade como valor estratégico. Como reforçou a Sanofi, uma empresa verdadeiramente diversa é aquela que reflete a sociedade onde está inserida — em idade, gênero, raça e experiências. “A diversidade precisa estar integrada à estratégia, não isolada em um pilar” O encontro com Sanofi e Volkswagen mostrou que o caminho para a maturidade corporativa é feito de aprendizado, comprometimento e cooperação. Cada empresa está em uma etapa diferente do seu roadmap Age-Friendly, mas todas compartilham o mesmo propósito: criar organizações mais humanas, inclusivas e preparadas para o futuro do trabalho. 💡 Quer saber mais sobre a Certificação Age-Friendly e como aplicar esse roadmap na sua empresa? 👉 Acesse agefriendly.com.br
31 de outubro de 2025
Sintomas da menopausa interferem no desempenho de 47% das mulheres
Pne
Por Contato Maturi 18 de setembro de 2025
5 benefícios equipes com diversidade etária