Reflexão MaturiFest 2020: “Nada sobre nós, sem nós”

Walter Alves • 24 de julho de 2020

 Na abertura do MaturiFest 2020, Alexandre Kalache, um dos palestrantes, nos provocou com uma frase que também é uma reflexão: “Nada sobre nós, sem nós”. 


O médico, certamente, sabe que o slogan não foi criado pelo movimento do envelhecimento ativo liderado por ele, e sim, originado no movimento das pessoas com deficiência ainda no século passado.


Não há uma data precisa de quando isto ocorreu, o que se sabe é que o bordão nasceu da consciência e experiência de ativistas no movimento pelos direitos civis dos negros no Estados Unidos.


A mensagem é clara, independente de onde tenha surgido, entendo que o alerta e a provocação é para que nós, os maturis, estejamos prontos a exigir nossa participação em qualquer assunto que tenha relevância para nós.


Não há decisão – de qualquer ordem – ou discussão de política pública que não devamos estar presentes ou representados sendo ouvidos e participantes da resolução. Quem mais sabe de nós, somos nós mesmos!

Impregnado por este raciocínio, identifiquei, nas salas de networking do MaturiFest 2020, participantes que compartilharam espontaneamente lembranças de suas histórias e expectativas para suas vidas e carreiras e pedi-lhes que enviassem depoimentos sobre aspectos pessoais que julgassem relevantes de serem divulgados.


Cristina Queiroz, 70, de Recife (PE), se diz uma peregrina na vida. Empresária há 30 anos e, hoje, em processo de transição de carreira, cursa especialização em Gerontologia na Universidade Católica de Pernambuco. 


Com formação em psicologia tem se interessando pelo estudo do envelhecimento, “Minha participação no MaturiFest 2020, abriu mais ainda esse horizonte, trazendo o tema do empreendedorismo e o mundo do trabalho para o público 50+”. 


No curso atual, faz uma pesquisa para sondar o impacto da idade no trabalho ao longo da vida buscando responder o que muda no trabalho com a idade através de entrevistas com pequenos grupos de pessoas com 20+, 40+ e 60+. 


“A hipótese é que em todas as faixas etárias há desafios relacionados à idade. Ao jovem se fala que ‘falta experiência’, aos que estão em torno de 40 se diz que ‘tá ficando velho’ e quando chega aos 50/60 diz-se que ‘envelheceu’. Qual o significado e o impacto disto para essas pessoas e para a sociedade?”


Anne Rosenstiel, Acari (RN), em seu trabalho como gerente de afiliados em plataformas digitais percebeu que muitas pessoas estavam tendo dificuldades em aprender a usar as ferramentas e entender os conceitos básicos do Marketing Digital.


“Então resolvi que tinha chegado a hora de transbordar todo o conhecimento que venho adquirindo ao longo desse último ano. Fiz uma pesquisa e descobri que mais de 60% do meu público era feminino e que estavam na faixa etária dos 50+ e que buscavam informações de como trabalhar utilizando a internet. Resolvi que, a princípio, iria impactar a vida de 100 mulheres até dezembro de 2020, ensinando o uso de redes sociais para montar suas máquinas de atração e como, também, poderiam fazer um cartão digital, site e páginas de captura."

O Universo foi tão generoso comigo que com um simples post na comunidade da Maturi no Facebook consegui colocar quase 50 mulheres dentro de um grupo do WhatsApp onde tenho feito 2 aulas semanais. Metade da meta batida. Agora, vamos à segunda turma a partir de agosto”.


Anne Rosenstiel utilizou os recursos que a Maturi dispõe para suas comunidades, Sandra Laranjo utilizou os serviços da então MaturiJobs cadastrando-se e conseguindo uma vaga.


“Em maio de 2018, vendi minha cafeteria para ficar próxima e cuidar do meu pai. Passados alguns meses, navegando na rede, cheguei até a Maturi. Participei de reuniões mensais, fiz curso no final de semana, conheci pessoas e me mantive atenta aos conteúdos e conexões abordados pela comunidade, minha tribo 50+. Em abril de 2019, recebi uma ligação e fiz uma rápida entrevista.


Uma semana e duas dinâmicas depois, estava começando a trabalhar numa empresa parceira da Maturi. Agora, por conta da pandemia e da crise econômica, fui demitida, porém continuo a caminhada, certa de que não estou sozinha e tenho na Maturi, um parceiro nesta nova busca e empreitada”.


Propósito, equilíbrio entre trabalho e vida pessoal, possibilidade de crescimento em nova área, autonomia, aprendizado, flexibilidade de horário estão entre as principais motivações para a construção de uma nova carreira.


Nos últimos 15 anos Bia Fioretti, 57, se transformou numa mulher movida pelo propósito podendo desenvolver várias habilidades. 


A carreira inicial foi dirigindo a criação de agências internacionais de publicidade por 25 anos. “Foi na mesma fase de vida que a gente casa e tem filhos. Sempre sonhei em engravidar e parir. Passei por dois partos, um ruim e outro pior ainda. No primeiro, além das 38 horas de trabalho de pré-parto, durante o nascimento, o fórceps fez um afundamento permanente na testa da minha filha. No segundo, a cabeça do bebê estava virada para cima e o médico decidiu virá-la dentro de mim. Foi como um estupro instrumental e não sei como sobrevivemos. Nos anos seguintes, entrei em processo anoréxico e meu marido em síndrome do pânico. Hoje, tenho a consciência que o casamento acabou na sala de parto! Quando nos separamos fui diagnosticada com câncer na tireoide e menopausa precoce. A história é longa, mas minha dor se tornou minha cura”.


Ao fazer a fotografia de um trabalho sobre a preservação das parteiras e benzedeiras tomou consciência que não precisava ter passado pelos dois partos difíceis.


“Por quase dez anos conciliei o trabalho em agências com as buscas por parteiras pelo mundo – foram mais de 1.000 entrevistas. Comecei a fazer palestras e expor fotos pelo Brasil e pelo mundo. Não falava de partos e, sim, através das imagens do movimento de ser parteira como uma essência do empreendedorismo, da universalização das nossos corpos e dos seres humanos em prol da paz. Quando transformei minha dor me curei dos distúrbios alimentares e não tive menopausa precoce”. 


O caminho de Leila Mestre, ao encontro do propósito, foi tão diferente quanto comovente. 

A moradora de Santos (SP) vivenciou, durante 6 meses, com o filho, a fase terminal de um câncer que o acometeu. “Durante este tempo, constatei a dificuldade das pessoas em lidar com algo que não se pode mudar. A partir daí pensei em como ajudar a diminuir esses sofrimentos que podem ser físicos ou psicológicos. Não é fácil despertar essa força interior, mas é possível”.


Hoje, concentra suas atividades discutindo e vivenciando o envelhecimento com maturis.

Durante uma das salas de networking, Marta Hemelrijk tocou num tema que para mim é muito caro: a acessibilidade de comunicação para pessoas com deficiência.


Perguntei qual o motivo da abordagem. Ela foi direta: “Tenho uma filha com deficiência física e trabalho com a educação inclusiva. Com o avanço da idade, começamos a ter algumas limitações que nos impedem a interação social. Cabe ao poder público e à sociedade dispor de ferramentas para que essa parcela da população – que cresce a cada dia -, dê continuidade às suas atividades com menor impacto possível.

Aproveito para parabenizar a toda equipe da Maturi pelo evento. Ele foi um divisor de águas para muitos maturis que agora se sentem mais fortalecidos”.


Estas mulheres representam a mim e acredito, a todos os participantes das salas de networking do MaturiFest 2020. Suas falas, ideias, narrativas e afetos deixaram-me orgulhoso. Certamente, estariam presentes, em corpo e alma, nas discussões sobre longevidade e envelhecimento levando nossas considerações, reivindicações e desejos e trazendo de volta as melhores notícias para as pessoas 50+. São dignas representantes do Nada sobre nós, sem nós.


Acompanhe abaixo um dos episódios da série “Trabalho no Futuro”, onde eu e Andréia Calina (co-fundadora do www.dialogonoescuro.com.br), destacamos que a inclusão dos diferentes só começou…

Reconhecer-se como idosa ou idoso não é uma tarefa fácil. É mais uma destas encruzilhadas que nos deparamos ao longo da vida.


Podemos ter um sem fim de aprendizados e de construção do conhecimento, mas para isto é preciso abrirmos nossos sentidos e soltarmos as âncoras de nossos sentimentos.


E mesmo assim, não há a garantia que atinjamos os resultados desejados. Nos tempos atuais, fica valendo mais ainda a velha máxima que o caminho se faz ao caminhar.


Conviver com necessidades e novidades jamais pensadas é estar disposto a uma atualização permanente de pensamentos e práticas tornando-os contemporâneos dia a dia. Sobra-nos pouco tempo para temer os fracassos, os erros inconscientes e as armadilhas que armamos para nós mesmos.


“O doce da vida pode ser observado quando conhecemos e temos consciência do amargo que experimentamos”.


Contatos:

Anne Rosenstiel – https://www.linkedin.com/in/anne-christine-rosenstiel-858082179/

Bia Fioretti – www.biafioretti.com.br – https://www.linkedin.com/in/bia-fioretti-2a634724/

Cristina Queiroz – cristina.queiroz@ampla.com.br

Leila Mestre – leillamestre@gmail.com

Marta Hemelrijk – martahemelrijk@gmail.com

Sandra Laranjo – https://www.linkedin.com/in/sandra-laranjo-3b25176a/ – sandralaranjo@uol.com.br


Compartilhe esse conteúdo

Artigos recentes

Como o Grupo Boticário e a Maturi criaram um projeto para posicionar a marca como um dos maiores ali
11 de dezembro de 2025
Como o Grupo Boticário e a Maturi criaram um projeto para posicionar a marca como um dos maiores aliados das mulheres maduras do Brasil
11 de novembro de 2025
O etarismo no ambiente de trabalho pode ser sutil — e, justamente por isso, perigoso. Muitas vezes, ele está embutido em processos, linguagens e práticas que parecem neutras, mas que na prática excluem profissionais mais velhos. O prejuízo não se limita a quem é deixado de fora, mas às empresas, que perdem talento, diversidade e performance. Segundo o relatório Future of Work 2023 , da AARP (American Association of Retired Persons), 2 a cada 3 profissionais 50+ já sentiram discriminação por idade no trabalho. No Brasil, a Pesquisa Maturi (2023 - acesse aqui ) mostra que 9 em cada 10 profissionais maduros estão em busca de recolocação. “Enquanto o tema for abordado como um posicionamento de marca, dificilmente haverá uma transformação genuína na sociedade. Porém, nós entendemos que esse esforço não pode caminhar sozinho pelo setor privado, é necessário que o governo e a sociedade estejam na mesma direção”, comenta Mórris Litvak, CEO e fundador da Maturi. Está na hora de rever práticas e criar ambientes mais inclusivos para todas as idades. A seguir, um checklist para você identificar se o etarismo ainda está presente na sua organização: Checklist: sua empresa está pronta para incluir talentos 50+? 1. Recrutamento e seleção: - Você analisa se profissionais 50+ estão chegando às suas shortlists? - As descrições de vaga evitam termos como “jovem talento”, “recém-formado” ou “perfil júnior”? - O RH considera profissionais maduros para cargos operacionais e estratégicos? 2. Cultura organizacional: - O tema da diversidade etária está incluído nas ações de DEI? - A comunicação interna retrata pessoas de diferentes idades em cargos de liderança? - Existem canais para denunciar qualquer tipo de discriminação? 3. Desenvolvimento e carreira: - Pessoas 50+ têm acesso a programas de formação, capacitação e mentoring? - A empresa promove ações para combater estereótipos sobre envelhecimento? - Há incentivo à troca intergeracional e à valorização da experiência? 4. Gestão de talentos e sucessão: - Profissionais maduros são considerados em planos de sucessão? - Existe um olhar estratégico para manter 50+ na ativa, inclusive com formatos híbridos ou carga horária flexível? 5. Preparação para aposentadoria: - Sua empresa tem programas voltados à transição e à preparação para aposentadoria? - Há políticas para que esse momento não represente exclusão, mas sim reorientação? Passando a limpo Se sua empresa respondeu “não” ou “não sei” para um ou mais itens, já é sinal de alerta. O etarismo estrutural pode estar presente e impactando diretamente a diversidade, a inovação e os resultados da sua equipe. O combate ao etarismo não começa só com treinamentos, mas com uma mudança de mentalidade nos processos mais básicos do RH. Trata-se de enxergar a idade como um ativo estratégico e não como um impeditivo. Já conhece a certificação Age Friendly? O selo Age Friendly Employer reconhece as empresas promotoras da diversidade etária. Atualmente são 19 empresas certificadas no Brasil, organizações que estão na vanguarda das melhores práticas para um ambiente inclusivo para pessoas 50+. Se a sua empresa quer entender como iniciar essa jornada e obter a Certificação Age-Friendly, preencha o formulário para agendar uma reunião com a nossa equipe.
4 de novembro de 2025
O último MeetupMaturi de 2025 reuniu duas empresas que vêm se destacando na pauta da diversidade etária: Sanofi e Volkswagen . Representadas por Alexandre Porto, Co-líder do grupo Gerações Conectadas da Volkswagen, e Elcio Monteiro, do Pilar de Gerações+ da Sanofi, as organizações compartilharam suas jornadas no processo de Certificação Age-Friendly Employer, mostrando, na prática, o que significa transformar a cultura organizacional em direção a um ambiente realmente multigeracional. O encontro revelou aprendizados valiosos sobre como as empresas podem evoluir em seus roadmaps age-friendly — da conscientização à implementação de ações concretas. A seguir, reunimos cinco grandes insights dessa conversa inspiradora. 1. A jornada começa conhecendo a realidade geracional da organização Antes de qualquer estratégia, é essencial conhecer a própria realidade geracional. A Volkswagen percebeu que o primeiro passo para se certificar era entender quem são seus colaboradores 50+, onde estão as oportunidades e quais áreas precisavam se envolver mais com o tema. "O primeiro passo é saber onde estamos e com quem estamos. A diversidade etária começa olhando para dentro" 2. Ser uma empresa age-friendly é assumir um compromisso público A Certificação Age-Friendly Employer não é apenas um selo — é um compromisso público de avanço contínuo. Como destacou a Volkswagen, o mais importante é demonstrar, de forma transparente, como a empresa reconhece e valoriza o protagonismo das diferentes gerações. "Mais do que conquistar a certificação, é mantê-la viva no cotidiano da empresa” 3. O que importa é evoluir: a recertificação mede progresso, não perfeição A Sanofi, primeira empresa certificada e recertificada no Brasil, destacou que o processo é uma oportunidade para comparar a empresa com ela mesma. A cada recertificação, é possível medir avanços, consolidar práticas e aprimorar o que ainda precisa evoluir. “A recertificação é sobre amadurecimento — ela reconhece quem continua aprendendo.”, Elcio Monteiro 4. Trocas entre empresas aceleram aprendizados Um dos diferenciais do ecossistema Age-Friendly é o espaço de trocas entre empresas certificadas. Durante os fóruns e encontros promovidos pela Maturi, companhias como Sanofi e Volkswagen compartilham experiências, desafios e soluções. Essa colaboração tem gerado novos programas, ideias e conexões que fortalecem toda a rede. “Quando as empresas trocam, todo o ecossistema evolui” 5. Diversidade etária é parte da estratégia, não um projeto paralelo Tornar-se uma empresa Age-Friendly não é sobre um programa pontual, mas sobre incorporar a longevidade como valor estratégico. Como reforçou a Sanofi, uma empresa verdadeiramente diversa é aquela que reflete a sociedade onde está inserida — em idade, gênero, raça e experiências. “A diversidade precisa estar integrada à estratégia, não isolada em um pilar” O encontro com Sanofi e Volkswagen mostrou que o caminho para a maturidade corporativa é feito de aprendizado, comprometimento e cooperação. Cada empresa está em uma etapa diferente do seu roadmap Age-Friendly, mas todas compartilham o mesmo propósito: criar organizações mais humanas, inclusivas e preparadas para o futuro do trabalho. 💡 Quer saber mais sobre a Certificação Age-Friendly e como aplicar esse roadmap na sua empresa? 👉 Acesse agefriendly.com.br