Deixe de lado a “propositite” e crie seu futuro

Regiane Bochichi • nov. 03, 2020

A futurista Lala Deheinzelin ensina o caminho das pedras: estar atualizado no uso de tecnologia, da criatividade, da colaboração, do compartilhamento.


Lala Deheinzelin não tem bola de cristal. Como uma das três maiores futuristas das Américas Latina e Central, não prevê o futuro. Vai além: cria futuros. Cofundadora do Núcleo de Estudos do Futuro da PUC-SP, parte do United Nations Millennium Project, é autora do livro Desejável Mundo Novo e coordenadora do movimento Crie Futuros e faz um convite para que todos sejamos coautores do mundo.


Com 62 anos, recém-completados, acredita que os mais velhos têm o conhecimento, a resiliência e a maturidade para atravessar o momento que estamos vivendo, de transição de uma economia do consumo para uma centrada no cuidar.


mulher de óculos de grau, cabelos longos ondulados, brincos e colar grandes, sorri para foto

Desde 2005, quando se tornou assessora especial em Economia Criativa, tem estudado e desenvolvidos técnicas que ajudam a compreender o presente e todas as oportunidades que ele traz para termos um futuro melhor.


Criou a metodologia denominada Fluxonomia, um sistema de gestão de empreendimentos e iniciativas que dialoga com as rápidas mudanças do século XXI, por meio das economias criativa, colaborativa, compartilhada e multimoedas.


Com múltiplos talentos, é atriz, coreógrafa, produtora cultural, foi indicada pela P2P Foundation, como uma das 100 Mulheres que estão co-criando a sociedade colaborativa, na categoria de “Pioneiras e Defensoras nos Negócios e Economia Ética”.


Em entrevista para o Blog da Maturi, falou sobre como podemos criar futuro que consiste em casar o que fazer que satisfaça o seu propósito e a necessidade do outro; nos manter atualizado e de entender como buscar valor no lugar de receita. Lembra ainda que não podemos sofrer de “propositite” e nem ficar exibindo por aí um propósito como se fosse um bichinho de estimação sem por a mão na massa e estabelecer processos.


Blog Maturi: Muita gente na faixa dos 50, acha que não tem tempo mais de criar seu futuro. Qual a sua opinião sobre esse assunto?


Lala Deheinzelin: Sempre há tempo para criar futuro e mais ainda, quando ficamos mais velhos. Primeiro, porque a gente tem sabedoria. Segundo, porque há pouco tempo que tem que ser muito bem aproveitado. E o melhor jeito de aproveitá-lo, é fazer aquilo que a gente gosta, sabe e que o mundo precisa.


Blog Maturi: Tendo a criação do futuro em nossas mãos, podemos fazer escolhas erradas e se a fizermos, tem tempo de consertar?


Lala Deheinzelin: Criar futuros é algo que se aprende, a medida que a gente vai se percebendo como coautor do mundo e não como vítima. A melhor maneira de aprender, sempre, é tentando.


Então é muito interessante quando começamos a pensar futuros, parece muito difícil. Com o tempo, vai percebendo que passa a se tornar um olhar.


Você olha ao seu rodar, pensando: puxa! Como eu poderia reinventar isso? E ao fazer isso, vai achando maneiras de poder se aprimorar e, aprimorar o entorno. Se somos criador, podemos consertar o que nós mesmo criamos.


Blog Maturi:  A pandemia acelerou as novas formas de economia e mesmo tendo a impressão que paramos por seis meses, podemos ter dado um salto quântico a um novo modelo de economia?


Lala Deheinzelin: A pandemia foi a causa, mas, mais do que tudo, um sintoma da necessidade de novas economias, modelos organizacionais, e sobretudo, uma forma de existir, a partir da colaboração e de repensar o que tem valor para cada um.


Esses meses parados foram anos avançando na direção de mudanças que precisariam ter começado a avançar um pouco antes. Porém, sempre é tempo.


E sim, faremos um salto quântico em relação às novas economias do compartilhar da infraestrutura existente, da colaboração, dividindo o que a gente tem de competências. Pois, se escasseia a moeda, o nosso conhecimento, não.


O que existe de infraestrutura ociosa, de espaços, de equipamentos, de materias, todas essas coisas que são bens e serviços de fato, isso não deixou desistir ou não tem uma desvalorização como tem moeda. Então, se a gente encontrar maneiras de circular isso: bingo! Vamos achando os caminhos necessários. E é isso o que vai acontecer. Seremos cada vez criaturas multimoedas e de multivalores que embasam essas moedas.


Blog Maturi:  Os maturis são de uma geração criada em uma sociedade que explorou os recursos naturais e o capital humano. Agora, estamos entrando na era da inteligência artificial e dos negócios exponenciais. Como fazer essa transição?


Lala Deheinzelin: Uma das chaves desta transição é sair de uma economia do consumo, que realmente acabou com os recursos naturais, para uma do cuidar.


Pois, cuidar pode ser infinito, há muitas coisas para serem cuidadas. Já o consumo é finito, podemos consumir pouco. Por exemplo, uso apenas uma blusa de cada vez.


Até posso comprar 1000 blusas, mas, não adianta muito, porque só consigo vestir uma. Na outra ponta, posso cuidar de 100 coisas ao mesmo tempo.


Essa característica do cuidar vai permitir que a gente continue criando novas formas de trabalhar e de se remunerar mesmo com a chegada da inteligência artificial.


O problema é que estamos abrindo mão do conhecimento de si mesmo, dos sistemas, de como funcionam as coisas. Estamos ficando com inteligência artificial e estupidez natural, porque estamos parando de aprender. Isso é terrível! Não vai ter cuidado que dê conta. Outra coisa que é muito interessante desta transição é que ela terá que ser cada vez mais intergeracional.


Blog Maturi:  Você sempre fala que mais do que em produtos, temos de pensar em processos. Como as grandes empresas encaram essa tarefa?


Lala Deheinzelin: Um dos desafios desta época é justamente passar do foco em produtos para poder pensar em processo. O processo é o como.


Muitas vezes, a gente sabe o que precisa ser feito, mas saber o que precisa ser feito é o ponto de partida e não é o ponto de chegada.


O ponto de chegada é saber como pode ser feito. Então, mais e mais, as empresas estão percebendo isso, porém, ainda, tem muito chão para andar. Por que qual é o problema? Um produto, eu encomendo, não preciso me envolver, digo dia tal, quero o produto pronto.


Mas, um processo não dá para encomendar a dizer tal dia está pronto e nem dá para ficar alheio. Processos, a gente se envolve. Eles são a única maneira de conseguir aquilo que é a chave deste momento que é fazer junto e também de criar novas estruturas organizacionais.


Então, esse é o foco. As empresas que estão conseguindo perceber isso: que o mais importante que o que eu faço, é como, estão se dando muito bem. Também, pelo seguinte: o que faço, me gera receita e receita é linear. Quanto eu consigo gerar de receita? Ela vai depender da minha capacidade produtiva, de comercialização, etc. Porém, o como faço é o que vai me dar valor que pode ser exponencial.


As empresas que estão percebendo a importância do como, do processo, são aquelas que estão na frente e são aquelas que tem maior potencial de longevidade. Porque quem não mudar a forma de fazer, está encrencado.


Até o próximo artigo. Comente abaixo!


Compartilhe esse conteúdo

Artigos recentes

Por Contato Maturi 12 abr., 2024
Alguns anos atrás, começamos a provocar o mercado com a seguinte pergunta: “Por que não tropicalizar a comemoração do Dia Europeu da Solidariedade e Cooperação entre Gerações (29 de abril)?” Agora, chegou o momento da ação: convocar as empresas que pautam suas ações de ESG no calendário da Diversidade, direcionado pelas datas comemorativas, a instituir um período para ter como “o mês de Gerações”. As datas comemorativas são celebradas porque carregam um contexto histórico e cultural significativo. Com a consolidação dos dias e meses através do calendário, tornou-se natural celebrar o passar do tempo. No entanto, mais importante do que apenas marcar essas datas, é refletir sobre o seu significado profundo… Realizar ações apenas em datas específicas do calendário de diversidade não torna uma empresa verdadeiramente diversa, equitativa e inclusiva. Contudo, integrar ações nessas datas também garante uma comunicação coesa de que a empresa está comprometida com a promoção de uma cultura inclusiva para todas as pessoas. A dica é de ouro: você tem duas oportunidades excelentes para isso! - Abril : Por conta do Dia Europeu da Solidariedade e Cooperação entre Gerações (29 de abril), que pode servir como uma excelente oportunidade para iniciar discussões e projetos focados na integração intergeracional. - Outubro : Este mês é marcado por duas datas significativas que tratam da intergeracionalidade: o Dia Internacional da Pessoa Idosa (1º de outubro) e o Dia das Crianças (12 de outubro), além do Dia da Menopausa (18 de outubro). Inserção: Reflexão sobre Dados e Estatísticas Segundo dados da Organização Mundial de Saúde, a população mundial de pessoas com 60 anos ou mais está projetada para dobrar de 12% para 22% entre 2015 e 2050. Isso destaca a necessidade urgente de políticas e práticas que não apenas acomodem, mas também integrem esses indivíduos na força de trabalho. Quando falamos de 50+, no Brasil, segundo o IBGE, já são mais de 56 milhões de pessoas (censo 2022), ou seja, 27% da população atual do país. Em 2040, a FGV estima que metade da força de trabalho do Brasil já seja 50+. Queremos ajudar e encorajar as organizações a refletirem sobre suas políticas e práticas de recrutamento, desenvolvimento e retenção de talentos, garantindo que estejam abertas a todas as idades e que valorizem a diversidade geracional. É possível criar um futuro onde a colaboração entre gerações não seja apenas uma ideia, mas sim uma realidade nos diferentes ambientes de trabalho. Portanto, vamos celebrar o Mês da Integração Intergeracional como um catalisador para a promoção dessa importante causa.
Por Contato Maturi 20 mar., 2024
Ser mulher, para mim, é ter muita curiosidade sobre o que é ser homem. Eu sei o que é ter privilégios em um país tão desigual, sei o que é ser branca, ser pessoa sem deficiência e ter intactas as faculdades mentais. O único fator social privilegiado que não conheço é o de ser homem. Só me cabe imaginar. Imaginar o que é ter segurança ao sair de casa sem camisa, de short apertado sem medo da sombra, sem ficar olhando 360 graus para antecipar algum perigo à distância, não ser atacada por olhares invasivos. Como é que deve ser passar por um grupo de homens desconhecidos, juntos numa esquina, e não ter certeza que vão olhar para sua bunda? Como deve ser se juntar com amigos numa esquina à tarde e olhar ostensivamente para bundas que passam? Eu não sei como é sair de casa de dia, em um lugar tranquilo, com a plena segurança de que consegue se defender? Como deve ser nem ter essa preocupação diária. Ir para o trabalho sabendo que pode alcançar cargos de diretor, presidente, gerente, sem se preocupar com barreiras invisíveis e, por isso, intransponíveis. Como deve ser passar a juventude sem medo de engravidar? Não ter qualquer outro plano submetido à maternidade. Não ter ansiedade sobre a dor do parto, algo equivalente à sensação de 20 ossos quebrados todos de uma só vez? Não correr o risco de ter a vida e o corpo implacavelmente alterados por, no mínimo, um ano, independentemente de sua vontade. Algo que pode acontecer apenas porque a natureza quer e deve-se estar alerta aos seus desígnios, sem arbítrio sobre o corpo, a não ser que cometa um crime. Eu não quero dar a entender que a maternidade é ruim, eu adoro ser mãe e há mulheres tristes por não poderem ser. É que eu fico curiosa para saber o que é nem ter esse tipo de preocupação na vida, mensalmente. E esperar feliz a menstruação, algumas vezes acompanhada de dores equivalentes a um infarto. No caso, a hemorragia é externa e junta-se a ela a aflição com calças brancas, estoque de absorventes, datas de viagens à praia e atenção redobrada para não matar algum ser vivo. Fora agir de maneira a ninguém notar que isso tudo está acontecendo. O desejo não acaba com a idade, assim como a curiosidade. Será que a um homem acontece de, em quase toda interação com uma mulher desconhecida, avaliar se está ou não propondo intimidade por atos, palavras ou sinais? Vou dar um exemplo: será que um homem vai fazer as unhas e fica preocupado se a calça está apertada e a podóloga vai se sentir convidada a apalpar seu pênis? Será que um grupo de homens em viagem de carro, que precisem parar à noite em um posto de gasolina suspeito, depois de segurar por quilômetros o xixi, ficam com medo do frentista agarrá-los à força? É esse tipo de coisa que eu queria muito saber. Você pode dizer que, a essa altura da minha vida, eu já sei boa parte do que pergunto. Sim, mulheres da minha idade são objetos de pouca atenção, e a mesma natureza esfrega na nossa cara a indiferença. E é por esse motivo que nem posso saborear o entendimento, já que lido com toda a transformação de uma segunda adolescência. Ao contrário. O turbilhão hormonal acontece de novo, com alterações involuntárias desgastantes, no sentido exato da palavra. Ossos, articulações, cabelos, pele desgastados. Como deve ser a andropausa? Será que ela obriga o homem a se equilibrar entre a tristeza no olhar que vê no espelho e a desonrosa saudade do olhar de desejo dos outros? Não quero diminuir a tensão que envolve o papel dos homens na dança do acasalamento humano; mas será que esse jogo acaba para o homem do mesmo jeito que para a mulher? Porque para nós, antes do fim, o capitão do time te coloca no banco do nada. E você passa de artilheira para gandula, depois de cansar de ficar esperando alguém lhe dar bola. É muito melhor quando são eles que não dão mais conta de jogar e param, não antes de realizar uma última partida festiva com amigos convidados e mulheres na arquibancada, que ainda vão dizer que estão todos bem de cabelo branco. Toda esta minha curiosidade sem fim (diferente deste texto) fica, obviamente, dentro de uma limitação cisgênero e geracional. Pode ser que as jovens de agora não tenham nenhuma dessas perguntas, mas duvido que não tenham outras. E imagino que a mulher atual, com todas as suas manifestações e bandeiras, tenha ainda assim aguçada uma característica que, independentemente de ser um substantivo feminino, une os gêneros. Se existe algo realmente igualitário é a curiosidade.
Por Contato Maturi 15 mar., 2024
No mês em que celebramos a força, a resiliência e as conquistas das mulheres em todo o mundo, é crucial lembrarmos que a jornada da mulher não tem um ponto final aos 40, 50, 60 anos ou mais. Pelo contrário, é uma jornada contínua de crescimento, aprendizado e contribuição, independentemente da idade. Na Maturi, reconhecemos a importância de valorizar e empoderar as mulheres maduras, que trazem consigo uma riqueza de experiência, sabedoria e habilidades únicas. Neste mês da mulher, queremos destacar o papel vital que as mulheres maduras desempenham no mercado de trabalho e a sua potência ainda pouco explorada nos diferentes ecossistemas profissionais. No entanto, quando se fala em Dia Internacional da Mulher, além dos eventos comemorativos ao longo do mês (#8M) pouco se discute sobre a intergeracionalidade das mulheres como um diferencial. Sabe por que? Um dos grandes motivos é a falta de repertório. A Maturi vem tropicalizando nos últimos anos ( saiba mais ) uma data relevante do mês de abril: o Dia Europeu de Solidariedade entre Gerações. É um mês pouco explorado no Calendário da Diversidade de forma geral e que tem total conexão com as estratégias de educar e letrar as pessoas sobre o tema. Qual é a contribuição dos diferentes grupos identitários e de diferentes faixas etárias no ambiente profissional? A diversidade geracional traz uma variedade de perspectivas, ideias e abordagens que enriquecem qualquer equipe ou empresa. Em um mundo em constante mudança, onde a tecnologia e as práticas de trabalho evoluem rapidamente, a colaboração entre as gerações é fator crítico de sucesso. As mulheres maduras têm um papel fundamental a desempenhar nesse processo de colaboração, oferecendo não apenas sua experiência profissional, mas também sua capacidade de adaptação e resiliência. No entanto, ainda há desafios a serem superados. Muitas vezes, as mulheres maduras enfrentam maior discriminação no mercado de trabalho do que homens 50+. Um exemplo disso é que, segundo o estudo sobre Etarismo que a Maturi e EY lançaram em 2023, 32% das mulheres que responderam ao levantamento estavam desempregadas há mais de 1 ano enquanto os homens representavam 20%. Já parou para pensar que a interseccionalidade se torna mais cruel para os grupos subrepresentados? Ao comemorar o mês da mulher, te convidamos a refletir sobre o papel crucial das mulheres maduras em suas equipes e a considerarem como podem promover uma cultura de inclusão e colaboração intergeracional. Não se esqueça que essa celebração não pode ocorrer 1x por ano, ou seja, somente no calendário que o mercado reconheça. Recomendamos, fortemente, que inclua o mês de Abril em seu planejamento como um possível mês que represente o pilar de gerações. #valorizeaidade #mulheresmaduras #mulheres50+ #8M #longevidade #maturidade #mesdasmulheres #diversidadeetaria #intergeracionalidade #combateaoetarismo
Share by: